sexta-feira, 30 de novembro de 2018

Esse poema é pra toda mulher presa




Esse poema não sabe nada de teoria poética
Nem de métrica
Nem de simetria
Esse poema sangra todo mês por natureza(?)
A mulher que sangra sem poder absorver 
a mulher que não tem nada de higiênico para absorver o sangue da vida
a mulher presa em todo cárcere
a mulher transexual presa
e aquela presa nos familiares
Ele chora todo mês ou semana de visita

Esse poema é pra mãe negra que chora o filho morto
Ou a esposa que sangra na alma o marido preso
Esse poema não conhece a vida doce das madames
Nem se interessa com seus vinhos, seus vexames
Ele sabe em que lugar, de classe, está colocado

Esse poema não é decassílabo
E nem tem rima rica
De rico aqui só nosso ódio
Só o que sobra do vestígio
Daquilo que te faz besta fera
Que te coloca de nádegas abertas
Nas filas de visita
No sol, na chuva ou na brisa

Esse poema faz planos
Faz comida nova no domingo
Coloca na marmita
Assa bolo e faz de tudo que é possível!
Para lá, dentro da cadeia
Na portaria,
Retirarem pedaço por pedaço,
Procurando chip.
Procurando um clips.
Tentando criminalizar aquela família

Esse poema é também, quem sabe, pra mulher presa em abusos
De homens e de mulheres!

Esse poema é pela não prisão de ideias!!!!

Esse poema não acredita em nada que venha de uma grade
Só é possível em liberdade
Esse poema não tem rima, nem tem medo.





sábado, 17 de novembro de 2018

Com outro gosto de café e de vida*



                             O silêncio da casa de Margarida aciona no espectador a agonia do inusitado, ao mesmo tempo em que, prevê o impacto contraditório pela cenas alegres e barulhentas do princípio do filme.
                             Café com canela, além de um passeio pela magia do cinema é a captura do espectador para entrada em seu interior, sem espaço para fuga de pensamento. Como nas próprias palavras de Margarida: "um bom filme quer te experimentar e ser experimentado!"
                             Também, e não menos, a maestria da jovem Violeta que; sendo mãe, cuidadora da avó, salgadeira, esposa, consegue de forma doce, mas de forma incisiva uma porta de saída do luto de sua antiga professora.
                             Café e canela, café com canela é a retomada do sabor da vida, é a força do(a) negro(a), é a sabedoria da religiosidade de matriz africana e, junto com tudo isso, o poder feminino no lidar com: o luto, a perda, a depressão, a morte, com a tentativa de recolocar o laço da vida em seu lugar.
                            E tempos de desgostos, canela e café é reviver o gosto, o quente, o brilho.




**

































* sobre o Filme "Café com Canela, de Ary Rosa e Glenda Nicácio, Brasil, 2017. Ficção 100m, exibido na Mostra de Cinema e Direitos Humanos em Belo Horizonte

** fotografia de divulgação retirada do Google