sábado, 30 de julho de 2016

Poesia quase a dois


Assim como se estivesse num quarto escuro
Com medo da luz chegar
Como se ansiasse pelo momento
Mas estivesse apavorado
Com sua iminência
Como se a simples possibilidade
De ser feliz
lhe causasse pânico
ou fosse quase
o contra-senso de si mesmo




terça-feira, 26 de julho de 2016

O propósito de esquecer

Ou poderia chamar também esquecer de propósito!
Porque hoje eu resolvi esquecer propositadamente o celular em casa, esquecer as redes sociais logo após esse escrito, esquecer qual a regra ensinaram-se ou tentaram me ensinar na Letras e classificar isso aqui na teoria literária.
Resolvi faz tempo esquecer quem só atrasa a vida da gente, quem espera retorno mas se dá muito pouco. Resolvi esquecer o regramento social faz tempo e falar palavrão, até em lugares onde as pessoas, familiares ou amigos, não os possa suportar.
Esquecer das mentiras que me contaram e das que contei, talvez teriam sido poucas e a troa foi injusta.
Quero esquecer o que causa tanta angústia, andar ali na rua, comprei um pão e algo para beber; e mais tarde, passada uma tarefa de trabalho/pesquisa permitirei tomar uma cerveja e esquecer que demorei mais de seis horas para conseguir chegar na cidade que moro, lembrando que da cidade que venho até ela, geralmente se gasta uma hora e meia nas caronas solidárias por um preço mais baixo, mas houve um cara nada solidário que, tentando enganar-se com um engarrafamento inexistente deixou-me esperando por ele duas horas e meia. Agora boba que não sou deixei-o também, mas não tão propositadamente(acabou a bateria do celular) e fui noutra carona ainda mais solidária!
Quero esquecer que a vida passa depressa, e ir indo, aproveitando o que dá.
Com o propósito de esquecer eu falo em uma sessão semanal de psicanálise e nesses retornos e esquecimentos vou lembrando que em anos de luta, em décadas de estudos, acadêmicos ou não, nunca tive agenda para me lembrar de nada, e nunca esqueci de nenhum compromisso, se isso não é adoecimento o que seria? Por isso tratar de(para!) esquecer.

Esquecer é a meta do cérebro para proporcionar saúde mental, lembrar pode ser perigoso. Esquecer é não precisar mais elocubrar, não mais divagar coisas que podem mais retroceder e menos avançar.

A única coisa que não pretendo esquecer é a condição de classe e o tipo de sociedade que AINDA, ainda vivo, em breve ou não, nas lutas para esquecê-la, construiremos outra.



terça-feira, 19 de julho de 2016

De época


Quando o vento de julho e agosto começa a cortar o céu vão subindo umas coisas coloridas, cheias de rabos, cheias de formatos, dos mais divertidos, dos mais criativos, parece que o tempo, a época da vida muda. O tempo já não é o mesmo do restante do ano, é tempo de olhar para o céu...
Teve um tempo que indo acompanhar minha mãe à casa de uma amiga, para um assunto bem doloroso, o neto dessa amiga dela saiu desarvorado de dentro de casa. Ela gritou:

“ Onde você pensa que vai menino?”

Ele:” Vou soltar papagaio*!”

Meu coração fez uma viagem longa à década de oitenta e diante daquela fala me dispus prontamente:

“ Deixa Marta eu vou com ele!”

Era impossível não ceder àquela frase:” Vou soltar papagaio!” Vinda, apenas de um menino de cinco anos! Como pode não passar pela cabeça de um pequeno que um carro pode matá-lo, que alguém pode roubá-lo, que ele pode tomar um choque com a linha nesses postes encrenqueiros da cidade?
Quem ia querer pensar em morte, medo, traumas diante de um possível vento, diante de um papel, recortado de forma geométrica, com um rabo, seguro por uma linha subindo aos céus? Só mesmo minha cabeça adulta ia fazer essa digressão disciplinada!
E lá nos fomos, mas era outra época, não era julho, nem agosto e não havia vento! Meu desejo se misturou ao de Gabriel e nem lembrei de avisá-lo que, sem vento, nada iria ao céu...talvez um avião...mas um papagaio não!
As pessoas cumprimentavam Gabriel: ”Oi!” Ele respondia olhando para o céu. Outros:” Onde você vai com esse papagaio menino?”
A nossa vontade era tanta que, só no momento em que eu segurava para que ele empinasse me lembrei:” Não vai subir! Não tem vento, não é a época!” Mas eu não disse nada, deixei que ele tentasse empinar, que corresse, que se desdobrasse...seria maldade minha? Creio que não! E lá se foi Gabriel! O papagaio soltou das minhas mãos e voou um pouco logo indo ao chão.
Ele me olhou um pouco decepcionado, estávamos longe, fui até ele e disse:” Não tem vento, não é a época ainda...”

Ele me olhou com olhos de quem sabe que a época vai chegar e disse:” Ah! Mas deixa chegar a época!”


Quase como um desafio, como uma esperança, e como alguém que, quando chegar a época estará preparado!




* em outros lugares do Brasil se diz pipa, e para achar no google a imagem só com "pipa",agora em Minas Gerais é papagaio!!