O marco da poesia

das delícias da vida, 

os intervalos do desejo 

da libido

do amor

do prazer

do viver ...

Quatro e mais meninos

Hoje eu vi três meninos algemados
Três meninos ficando doidos
Exatamente por serem algemados, encarcerados
Hoje, no serviço de urgência em saúde mental,
Homens negros
Vigiavam meninos também negros
E um homem negro, psicólogo
Que escutou o menino que queria ir
Estava com ele, cuidando...
Meninos que haviam pensado em se matar
Porque todo mundo, mesmo que não admita,
Já pensou em partir!
Mas hoje também, eu, e outras pessoas
Oferecemos bom dia
Olá
Sorrisos
Para meninos doidos ou algemados
Ofereci papel para uma carta
Ofereci o que eu sabia da linguagem

Hoje, o menino pôde ser menino
Não só preso
Não só doido...

Laila Vieira de Oliveira

para os meninos e
Para Paulo Alves Lins...o psicólogo 

Nunca perdi pra morte, perdia para a vida

Eu nunca havia perdido um menino

Menino do dito crime

Menino-treta

Menino-problema

Menino-marmanjo

Menino-moleque!

Nunca perdi nesses caminhos

Nessas idas e vindas

Menino travesso, avesso ao regrado

Hoje perdi uma menina

Menina não perdida

Achada

Seja pela política, mas encontrada

Perdemos para a morte

Antes só perdia mesmo era pra vida

Perdia para a violência de Estado

Perdia para a absurda violação de direitos

Hoje, nesse momento, perdi para a morte

Menina linda

Menina vestida de noiva de festa junina

Menina de vida

Vida talvez dura, mas vida!

Que não seja uma vida-luta perdida!

No mundo de "e daí?"

No mundo de "e daí?" morrem milhares numa nova doença chegada
ainda não se sabe de onde
Porque onde de pobre é na esquina da favela
Onde o pobre vai com a marmita para o trabalho, e daí?
Onde o favelado perde o filho preto morto pela polícia dos de lá
Onde aqui e acolá, pra mais além de si 
não sobra vez pra falar

No mundo de "e "daís" é preciso inventar código
código de passagem
auxílio
600 reais que tu vai ter de graça
na graça de deus que nem aí a gente sabe por onde anda
mas é deus acima de todos!

No mundo dos daqui
os de lá estão desesperados pela massa de volta na linha de produção
apertando os botões de seus futuros carros
lavando as louças de suas pias de ouro, limpando seu chão
tirando a merda de seus filhos ricos!

porque é inimaginável esse povo sem trabalhar!
absurdo!
nossa casa sem a escrava na cozinha
uma copeira com um "Moet & Chandon
nosso carro sem o motorista pra compras na Louis Vuitton

como pode? Agora esse povo vai só fazer samba?
ficar na corda bamba?

ou vai morrer de fome ainda mais?

O mundo de e daí precisa de escola diferente
esse monte de burrinho sentado um atrás do outro já chega
essas fileiras que não ensinam nada

O mundo novo é daqui, pra daí se safarem os que fizeram a verdade da História!

O fascista ri na nossa cara

O fascista ri na nossa cara
Ri dela também
dentro dele um escárnio de nosso silêncio

O fascista debocha literalmente da nossa cara
quando nós fazemos cartas
memorandos
assinamos petições em internet

o fascismo cospe nos nossos mortos
quando nós aceitamos de pronto uma queima de arquivo
um caso não solucionado
uma mulher no poder retirado!

Os fascistas riem da nossa cara todo dia
se refestela em nossos cadáveres
porque nós acreditamos no Estado
na democracia
nos troféus apenas
em cartazes que apenas dizem
mas pouco fazem

O fascismo se satisfaz da nossa fraqueza
da nossa sangria
olha na nossa cara e diz que nada podemos fazer
apenas uns pequenos insultos
nada de resposta mordaz

O fascismo só acaba com sangue
com acordos, continuamos inertes.